IMAGINAÇÕES E INTERROGAÇÕES
Imaginem que um dado projecto político defende serviços públicos e pugna por uma política local autárquica de proximidade e ao serviço das populações.
Imaginem uma freguesia de alguma dimensão e com um tecido social caracterizado por uma população, essencialmente, trabalhadora que a acolhe como dormitório e centro da sua vivência.
Imaginem que alguém se dirige à Junta de Freguesia e pede para ser atendido por um técnico competente que o possa apoiar, ajudar e acompanhar e comunicam que não há e o encaminham para uma IPSS.
Imaginem que está recenseado nessa freguesia, tem falta de habitação, está desempregado, sofre de violência doméstica ou tem outros problemas sociais e se dirige á Junta e não há nenhum técnico especializado para o atender (Técnico Serviço Social, Psicólogo ou outro).
Imaginem que determinada força política defende a criação de Comissões Sociais de Freguesia, mas o seu eleito com funções executivas, nunca pugnou por tal.
Imaginem que essa mesma força política defende a criação de uma Rede Pública de lares, de serviços públicos de Apoio Domiciliário e de gabinetes de atendimento social autárquico e que o seu eleito, na “imaginária” freguesia, aceita integrar o Executivo com o Pelouro da Acção Social, sem nenhuma condição: E que o tal autarca se dedica exclusivamente a gerir o existente, sem qualquer suporte técnico especializado, deixando o papel social totalmente entregue às IPSS.
Imaginem que esse autarca se opõe às propostas de outras forças políticas que exigem consonância na acção executiva com as posições que assumia quando estava na oposição e coerência com as bases programáticas do Partido que diz representar.
Imaginem que uma pessoa sem meios e minorias que precisam de ajuda se dirigem à Junta de Freguesia para falar com um técnico (como felizmente ocorre em muitas Juntas de freguesia que tem gabinetes sociais com técnicos especializados no quadro) e a resposta é o encaminhamento para uma instituição privada, sem qualquer reacção ou medida política por parte do membro dessa força política de esquerda no executivo, para inverter a situação.
A esquerda não pode abdicar dos seus princípios e das suas propostas e nos compromissos há linhas vermelhas inultrapassáveis. Mas há quem não se preocupe com a população e os seus problemas sociais mas apenas com a projecção e visibilidade.
Quando esse imaginário se torna, infelizmente, realidade surgem as interrogações. Como podemos lidar com esta atitude política quando o autarca, em causa, continua a merecer a confiança política nas próximas eleições autárquicas, quando outros são impedidos de concorrer pela mesma força politica em que milita ou apoia e são ostracizados com base na mentira por delito de opinião.
No plano político, tais comportamentos terão consequências futuras e apenas servem para que a população não perceba as diferenças e se deixe levar pelos contos de sereia do populismo ou dos poderes instalados.
No plano autárquico, é fundamental a afirmação da alternativa por uma democracia local participativa e representativa em prol das populações. Não há, em muitos casos, nenhuma simbiose entre o trabalho realizado (onde o há) e os problemas, anseios e reivindicações da população local.
Há que ultrapassar o espaço fechado e “saltar” para os locais de residência, trabalho e para os movimentos associativos e sociais: Há que ser uma oposição firme e consequente contra a direita e exigente e claro nos compromissos, quando se assume responsabilidades executivas.
As autarquias têm uma dinâmica de trabalho quotidiano de proximidade com as populações, forças vivas e movimentos sociais que variam consoante a freguesia e o concelho. Há que saber responder, sem cedências, a essa complexidade.
A ligação às populações e a forma como ela se opera é essencial no alargamento da base de apoio local.
É, ainda, indispensável estudar, compreender e acompanhar as prioridades e opções de gestão, conteúdo das propostas e seus objectivos.
É fundamental adequar, de forma assertiva, as principais opções de acordo com as necessidades e interesses das populações. É um caminho árduo, necessário e ainda longo a percorrer que não se compadece com a falta de princípios ou acção apagada que apenas alimenta a força maioritária que detêm o executivo que o eleito de esquerda integra.
Na actividade autárquica é crucial ultrapassar problemas concelhios de enquistamento e sectarismo. Se tal não acontecer, os resultados serão fracos ou ficarão aquém das expectativas e potencialidade eleitorais, as populações sentem que foram enganadas, a direita que detêm o poder agradece e o populismo progride.
A influência e o reforço da posição das forças políticas de esquerda nas autárquicas só serão possíveis se potenciar o projecto e se for capaz de o alargar a muitos sectores e camadas da população.
Reforçar e ampliar a base eleitoral autárquica (votos, percentagem e eleitos) só será conseguida com responsabilidade, humildade e um projecto sólido e perceptível a nível local.
Há que alargar o diálogo com os movimentos sociais e forças vivas das freguesias e concelhos (colectividades, instituições sociais, culturais, universitárias e outros grupos de intervenção).
Há que prestar uma cuidada atenção às questões sociais e laborais locais tendo como preocupação o apoio e devido enquadramento.
As respostas próprias em função da freguesia e do concelho, designadamente, em matérias de urbanismo, parque habitacional, mobilidade, espaços verdes, acção social, associativismo, educação e cultura têm de estar presentes, sem prejuízo de uma abordagem geral.
Não consigo encontrar respostas para um imaginário que é real, que não pode deixar de preocupar quem à esquerda não abdica da luta e da defesa de um poder local virado para as populações, que defenda os meios e as condições nas Juntas de Freguesia para que possa ter uma acção directa no apoio aos excluídos, explorados e aqueles que precisam de um ajuda social directa e não de encaminhamento, por falta de instrumentos públicos, para Instituições privadas, por muito que o seu papel seja importante. Desistir desta luta é abdicar de políticas de esquerda só para se ter um pequeno poder.
A Convergência é um espaço político de reflexão, integração e de propostas claras sem tibiezas, ou necessidade de unanimismos ou estados de alma, respeitando todos aqueles que se revêem numa solução ecossocialista e anticapitalista.
Este blog é um preciso contributo para “Reconstruir a pluralidade, respeitar a diversidade e pugnar pela unidade para conseguir caminhos de afirmação, com debate livre e por alternativas constituem outras das nossas prioridades.”
Neste quadro e com o objectivo da clarificação e melhoria do trabalho político autárquico expresso as mais leais e sinceras preocupações.
Sou um homem livre e de esquerda que não abdica da luta e não se deixa castrar por delito de opinião, no meu direito de poder intervir por soluções que retirem a maioria à direita e impeçam o crescimento de forças populistas e racistas. Estive, estou e estarei sempre deste vosso e nosso lado da luta, caminhando na construção de uma alternativa forte, em que todos contam.
Maia, 30.07.2021
António Neto
Excelentes questões para refletir - e as imaginações não são efabulações!
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