É fundamental humanizar o Sistema Nacional de Saúde!
A realidade da crise pandémica trouxe, sem dúvida, muitas alterações na vida das pessoas e das instituições, devido às várias medidas de confinamento e de circulação de pessoas.
No que respeita às instituições de saúde, começaram a sofrer desde o início da pressão, pois não estavam preparadas para uma situação de internamento em massa. Paralelamente, as/os diferentes profissionais sofreram enorme pressão para conseguirem dar resposta aos inúmeros casos de doentes COVID19.
Inicialmente, foram tomadas medidas de prevenção e segurança. No que respeita à prevenção, foram suspensas as visitas às/aos doentes internados/as, adiadas consultas e operações e alocaram os recursos humanos (médicos/as, enfermeiras/os, assistentes operacionais e outros/as) para as alas de tratamento das/os doentes COVID. Foram implementados circuitos para doentes com sintomas COVID e, posteriormente, foram reconvertidos espaços em alas COVID para possuírem condições de isolamento e segurança dos/as referidos/as doentes. Houve profissionais de saúde que deixaram de poder ir a casa e ficaram hospedados/as em hotéis, de forma a prevenir possíveis fontes de contágio.
Conseguimos assistir a uma onda de solidariedade e as palmas entoaram nas varandas e janelas nos diferentes pontos do país. Heróis esquecidos!
Um hospital, um centro de saúde ou uma unidade de saúde possui diferentes recursos humanos que acabam por não estar diretamente relacionados com o tratamento do/a doente, no entanto, são essenciais para que toda a dinâmica da instituição esteja em sintonia e não falte um cateter ou mesmo uma máscara.
Nem todas as instituições estiveram em sintonia nos procedimentos de escalas, equipas em espelho e teletrabalho. Numa das realidades que conheço, fizeram escalas de equipas em espelho, parte estava presencialmente e outra em teletrabalho para assegurar que todo o circuito do sistema continuasse o mais normal possível, desde as compras, distribuição, pagamentos e muitos outros serviços. Profissionais de saúde essenciais para que nada possa falhar ou faltar para que a segurança e o tratamento do/a doente seja assegurado na sua plenitude.
Sabemos que o setor da saúde está muito sobrecarregado no enfrentamento da pandemia. Quais são as principais lacunas? Quais as principais dificuldades?
Desinvestimento, falta de meios humanos, desvalorização das carreiras profissionais, falta de equipamentos e a burocracia. Falta de aposta na prevenção em vez de apenas no tratamento.
A crise do COVID19 veio expor a falta de investimento no sistema nacional de saúde, ao longo dos últimos anos, mostrando várias fragilidades, sobretudo a carência de meios humanos e técnicos. No que respeita aos meios humanos, houve um total abandono de algumas categorias, nomeadamente, as/os assistentes operacionais, assistentes técnicos/as. Ao longo das últimas décadas, o seu salário mantém-se inalterado, salvo pequenos aumentos, sem qualquer progressão de carreira. Há relatos de assistentes técnicos/as que continuam a receber os mesmos €703 EUR ilíquidos (igual a quem acaba de chegar ao SNS. Deixou de haver contratações públicas; agora, são os CIT - contratos individuais de trabalho - o que sinaliza a precariedade, abandono e desinvestimento numa área chave da sociedade portuguesa.
Continuamos a observar muitas instituições a recorrerem à mão-de-obra barata através de contratos de emprego inserção (CEI), perpetuando, deste modo, as lacunas.
A complexidade do SNS, por vezes, torna inoperante o sistema. Se pensarmos na hierarquização deste sistema, vamos encontrar muitas siglas ligadas ao Ministério da Saúde e ao serviço nacional de saúde (SNS): SPMS, ACSS, ARS, ACES, ULMS, entre outras. Não tenho uma resposta completa para a questão, mas considero que deveria ser pensada uma uniformização para tornar o sistema mais eficiente e operacional. Considero que outra das dificuldades é atrair capital humano especializado devido aos baixos salários praticados no setor da saúde.
Há ainda o recurso de Outsourcing para diferentes serviços, tais como médicas/os tarefeiros/as, higienização e limpeza. A continuação e aumento do recurso a serviços externos denota que não há capacidade de resposta interna.
Com tudo isto, devemos questionar: que SNS queremos no futuro próximo?
Do seu ponto de vista, quais as medidas mais urgentes para melhorar a intervenção das/os profissionais de saúde em tempos de crise pandémica?
Primeiramente, considero que deveria ser dada resposta à expectativa criada. Ou seja: foi bastante noticiado que as/os profissionais que haviam estado na linha da frente no combate à COVD19 iriam receber um subsídio; no entanto, essa medida e/ou promessa veio a esfumar-se e só um número muito reduzido de profissionais pôde receber o o referido subsídio.
Aqui, denota-se que há profissionais de vários níveis: primeiro, segundo, entre outros. Quem são, de facto, os/as profissionais de saúde? Os/As médicas/os? Enfermeiras/os? Técnicas/os de diagnóstico terapêutica? Assistentes operacionais? Assistentes Técnicos/as? Fisioterapeutas?
Considero que é urgente rever e reverter as carreiras profissionais. Tornar as/os diferentes profissionais com direitos iguais e reverter os CIT em funcionários públicos.
Atualmente, os governantes pedem para investir na formação, quando grande parte destes/as profissionais ganha, praticamente, para poder pagar a renda de casa. Se há, nos/as funcionários/as públicos/as alguém com grau de licenciatura, mestrado ou doutoramento, deveria receber de acordo com o estipulado para quem possui esse grau, seja um/a assistente operacional ou outra categoria.
Dar a possibilidade de os/as profissionais poderem usufruir de formação para aumentar as suas competências técnicas e humanas para poder humanizar o sistema nacional de saúde.
A digitalização de todos os processos implica que os processos sejam demasiado burocráticos, implicando, por sua vez, que as/os profissionais passem mais tempo a olhar para o monitor do que para a/o doente.
Humanizar! Apostar na prevenção primária, em vez de somente no tratamento. Suponho que sejam dois aspetos a considerar para melhorar a intervenção das/os profissionais de saúde.
MARIA GOMES, 17 agosto 2021.
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